A narrativa a seguir, extraída do
livro de Joseph Townsend (apud HARDIN, 1989), relata em sentido metafórico, o processo
de crescimento em uma sociedade ou organização humana, o qual denomino de
crescimento amebiano ou não diferenciado ou inorgânico.
O Texto é semelhante a uma lenda ou história do tipo "era uma vez", mas se trata de uma teoria, que poderíamos chamar de neo-malthusiana, formulada em 1786 e que procurava mostrar os efeitos da superpopulação sobre o desenvolvimento de sistemas vivos, antes mesmo de Adam Smith publicar o seu conhecido "A Riqueza das Nações. Vejamos, então, o texto de Townsend:
O Texto é semelhante a uma lenda ou história do tipo "era uma vez", mas se trata de uma teoria, que poderíamos chamar de neo-malthusiana, formulada em 1786 e que procurava mostrar os efeitos da superpopulação sobre o desenvolvimento de sistemas vivos, antes mesmo de Adam Smith publicar o seu conhecido "A Riqueza das Nações. Vejamos, então, o texto de Townsend:
Nos Mares do Sul
há uma ilha chamada Juan Fernández em homenagem ao seu descobridor. Neste lugar
remoto, Juan Fernández fundou uma colônia de cabras com um macho e uma fêmea.
Este par feliz encontrou em abundância pastos pelo que, sem a menor
dificuldade, obedeceu ao primeiro mandamento: crescer e multiplicar-se, até
que, com o tempo, sua ilha se encheu de cabras. Antes que isto sucedesse
desconheciam a miséria e a necessidade e até pareciam orgulhosas de seu número,
porém a partir de então começaram a padecer de fome. Contudo, por algum tempo
seguiram-se multiplicando em tal grau que se tivessem o dom do raciocínio
haveriam compreendido que se aproximava uma fome. Diante disso, desapareceram
primeiro os mais fracos e a abundância ressurgiu. Entraram, assim, em ciclos de
felicidade e miséria, com abundância quando a população diminuía e escassez se
esta aumentasse; nunca conseguiram a estabilidade, porém quase sempre a
quantidade de alimentos era equilibrada. O equilíbrio foi quebrado de vez em
quando, seja por epidemias ou pela chegada de um navio em desgraça. Em tais
ocasiões, a população se reduzia consideravelmente, porém para compensar a
situação alarmante e consolar-se pela perda de seus companheiros os
sobreviventes sempre recuperavam de imediato a abundância. Já não temiam a
fome, já não se olhavam com desconfianças, todos viviam na abundância, todos
estavam contentes e felizes. Assim, o que se poderia fazer considerando uma
desgraça se convertia em uma fonte de comodidade e, ao menos para eles, o mal
parcial constituía o bem universal.
Para prejudicar
os corsários ingleses que invadiam a ilha em busca de provisões, os espanhóis
eliminaram as cabras deixando na praia um casal de galgos [uma raça de
cães]. Os cães cresceram e se
multiplicaram de acordo com a quantidade de alimentos disponíveis; os
resultados foram os previstos pelos espanhóis: escassearam os alimentos das
cabras. Se estas desaparecessem totalmente os cães também desapareceriam. Isto
não ocorreu assim porque muitas cabras se retiraram a níveis inacessíveis para
os cães e desciam aos vales só o tempo necessário para alimentar-se com temor e
circunspecção; fora as descuidadas e as temerárias poucas se convertiam em
presas e só os cães mais alertas, fortes e ativos conseguiam comida suficiente.
Estabeleceu-se, assim, uma nova classe de equilíbrio. Os mais fracos de ambas
as espécies foram os primeiros em pagar sua dívida com a natureza; os mais
ativos e vigorosos preservaram sua vida. É a quantidade de alimentos o que
regula a quantidade de população da espécie humana. Nos bosques e no estado
selvagem o número de habitantes pode ser pequeno, porém quase ninguém padece de
escassez. Enquanto abundem os alimentos, os homens continuarão crescendo e
multiplicando-se; cada homem poderá sustentar sua família, ou ajudar aos seus
amigos, em proporção direta a sua atividade e sua força. Os fracos dependem da
abundância precária dos fortes e os preguiçosos, cedo ou tarde, padecem a
consequência natural de sua indolência. Se se introduzisse uma comunidade de
bens e ao mesmo tempo se desse a cada homem a liberdade de casar-se, em
princípio aumentaria a população, porém não a soma total de sua felicidade, e
gradualmente, quando todos estivessem reduzidos à escassez e à miséria, os mais
fracos começariam a perecer.
A
forma linear como estamos discutindo uma maneira de mudança econômica que possa
reduzir o consumismo e a produção de bens baseada em energia não renovável, bem
como o obsoletismo programado de produtos que têm suas vidas úteis
artificialmente ou tecnicamente reduzidas, a fim de aumentar o consumo e, com
isto, a acumulação de riquezas dos investidores e proprietários de empresas,
não resultará ou não será nunca efetivada dentro da conjuntura econômica
mundial, pelo menos nos próximos 30 ou 40 anos porque o discurso que os
cientistas e filósofos do decrescimento realizam não propõem qualquer mudança
comportamental.
Para
se promover qualquer mudança no sistema econômico mundial tem que se começar
com a mudança de comportamento de indivíduos, uma vez que o sistema implantado
pelo capitalismo alterou de forma violenta os modelos mentais das pessoas e com
isto gerou hábitos nocivos, mas úteis para o crescimento de seus negócios e,
deste modo, proporcionando de forma progressiva o aumento individual e familiar
de riqueza em detrimento do aumento da pobreza e dos danos físicos e biológicos
à natureza, ao ambiente natural.
A
história de Townsend procura retratar exatamente um dos caminhos que são
seguidos para o condicionamento visando de alguma forma acumular bens em prol
de interesses individuais e sem levar em conta a biodiversidade. Alguns dos que
discutem o decrescimento até que procuram mostrar fatos, porém não avançam em
termos de uma bioeconomia que possa trazer benefícios capazes de, pouco a
pouco, ir desconstruindo os modelos mentais que criaram os hábitos e paradigmas
que se tornaram os vícios econômicos consumistas que contaminam todas as
sociedades em todos os países.
Não
apenas devemos discutir o decrescimento econômico, mas de modo efetivo o
decrescimento do comportamento que promove o consumismo, o decrescimento
populacional até que se consiga formar uma geração sadia, com hábitos sadios,
voltada para a simplicidade da vida e para uma vida sem sofisticação e sem
artificialidade, no que chamo de biodecrescimento. Com isto não estou
incentivando o controle rigoroso da natalidade, mas uma breve interrupção do
crescimento populacional, a fim de se poder gerar uma nova população sem os
condicionamentos de uma condição Ter de vida e bem direcionada para uma
condição Ser de vida. Aí, sim, poderemos voltar a ter um novo e sadio
crescimento populacional sem prejuízo para o ser humano e para a natureza. No
mais, se percebe nos discursos e debates que se realizam, em especial nos Foros
Sociais e contraposição aos Foros Econômicos, são argumentos e falácias os quais
não agregam valor à vida e ao ambiente planetário, porque estão presos a um
círculo vicioso e tenta repetir o que se fez em termos políticos e econômicos
cujos resultados não têm sido bons até agora.
Por
isso tenho dúvidas sobre o real valor de uma filosofia de decrescimento que não
vai criar nada de novo para a humanidade e que vai repetir os mesmos erros e
enganos que geraram o crescimento amebiano em várias regiões do planeta.
Portanto, como discurso tudo o que se fez até agora é muito bonito, cheio de
palavras de ordem e apelos semelhantes àqueles que os ludditas realizaram
durante a Primeira Revolução Industrial. Precisamos interromper o uso abusivo
de energia não renovável que vem gerando há séculos o crescimento inorgânico
com a total destruição da natureza. Isto é fato e é importante. Porém,
precisamos de criar os meios efetivos para que se comece a colocar em prática o
crescimento orgânico, no qual tudo o que se produz se fará com a ajuda da
Natureza e não em seu detrimento. Ou seja, torna-se necessário que voltemos a
aprender com a Natureza como usar os recursos naturais sem destruí-los, mas
preservando-os a fim de podermos utilizá-los e reutilizá-los, sempre que for
preciso.
Assim,
devemos criar uma bioeconomia que vai desenhar diretrizes para uso correto de
recursos naturais, aliada a um biodecrescimento em busca de uma geração mais
sadia em todos os sentidos: logosférico,
biosférico, hilosférico e noosférico, com o que poderemos num futuro (em um
novo futuro que pode ser para além das próximas duas ou três gerações) ter no
Planeta uma nova raça, um novo ser humano que irá se reproduzir na certeza de
que não mais estará promovendo o aumento de uma população doente nestes quatro
sentidos do Ser Integral. Desta forma, não devemos fazer o que mostrou a
estória relatada por Townsend, como fizemos até agora.
Essa
proposta que busca enfocar uma Economia Orgânica não representa retroceder no
tempo ao nível de uma primitividade já vivida, mas avançar no tempo procurando
promover uma mudança no paradigma consumista e capitalista acumulador de
riquezas que não leva em consideração uma vida saudável. Viver de modo saudável
para mim não implica em voltar ao passado, ao ambiente do homem primitivo, mas
criar um novo ambiente do bem, no qual possamos viver melhor e mais tanto em
sentido biológico quanto ecológico e natural. É possível, sim, produzir mais
com menos consumo de energia não renovável, com bioenergia e eco-energia de
modo a podermos recuperar os danos que foram causados no Planeta nesses mais de
400 anos de exploração desenfreada dos recursos naturais.
Pão, Paz e Liberdade