L.I.D.E.R. Ideias e Princípios

L.I.D.E.R. Ideias e Princípios
Imagem da Capa do Livro

quarta-feira, 9 de agosto de 2017

NOVAS TECNOLOGIAS, NOVAS EMOÇÕES E NOVA EDUCAÇÃO
(Para o tema Liderança)

O século 21 está a exigir das pessoas e, por extensão das organizações, conteúdos, ações e atividades que programem e projetem novas emoções em todas as áreas de conhecimento, a começar pela Educação, seguida da Economia, Política, Social, Cultural e Negocial. Não se trata aqui de rebuscar, repintar ou redesenhar, apenas, as tradições que emocionaram as pessoas nos últimos milênios, mas introduzir novos apelos emocionadores positivos que sejam criativos e proativos e tragam para as pessoas cargas importantes de energia emocional otimista.

No caso específico da Filosofia e da Administração podemos falar de uma Filosofia Emocional e de uma Administração Emocional. Esta última pode ser estendida para uma Administração Espiritual como parte intrínseca da Administração Integral agindo em seus principais sistemas e como base do Marketing Emocional e Espiritual; contudo, sem considerá-lo uma disciplina à parte ou em forma de um fragmento da Administração em uma área holística de Conhecimento, de forma que supere os atuais apelos e seja capaz de criar novos comportamentos em sentido educacional, social, político, econômico e cultural observando os critérios de transdisciplinaridade.

Uma frase bastante curiosa que foi pronunciada pelo escritor José Saramago em uma entrevista na TV, respondendo a uma pergunta do entrevistador, quando este se referia a sua origem profissional como mecânico de automóvel, foi bem apropriada para mostrar que tudo muda tudo está a mudar, ou já mudou; contudo a maneira como nos referirmos às coisas mostra pouco dessas mudanças ou mostra, sobretudo, como acreditamos que as pessoas são efetivamente resistentes às mudanças comportamentais.

Disse o escritor, quando o repórter lhe perguntou se ele ainda seria capaz de concertar um carro: “Já não sou mais o mesmo, contudo os carros também já não são os mesmos”. É possível que o escritor desejasse dizer que ele mudou, avançou no tempo do conhecimento, porém os carros também mudaram e o conhecimento que ele ainda guarda de mecânica já não poderia atender às necessidades atuais da nova mecânica de automóvel.

Isto me faz pensar que a resistência à mudança ou os caminhos e procedimentos utilizados pela maioria das pessoas no sentido de mudar-se, de transformar-se têm sido provocadores de desastres e grandes prejuízos para os envolvidos e, até, para as suas famílias e para o próprio estado. Leva-se em conta, neste caso, o uso das tecnologias sem que haja uma mudança de comportamento ou uma educação efetiva para que as populações utilizem esses artefatos.

Assim, vejo que a tecnologia nas mãos de pessoas inábeis tende, pois, a gerar prejuízos e perdas irrecuperáveis como a vida humana. Os números (estatísticas) mostram diariamente ou mensalmente, a depender do impacto que os acidentes oferecem para o noticiário: os que vitimam pessoas causam mais perdas humanas que muitas guerras ou conflitos armados. É como dirigir um automóvel como se fosse uma carruagem. Ambos têm um propósito similar: transportar pessoas ou coisas, mas são tecnologicamente distintos; mas a população ainda não se deu conta, pelo menos nessas regiões que estão à margem da Economia do Conhecimento, portanto obsoletas, que tudo mudou e que existem novas regras, novas práticas.

As inabilidades, todavia, retratam bem a Obsolescência Humana segundo os critérios de uso das tecnologias. Os artefatos desenvolvidos pelas empresas, graças ao avanço da Economia do Conhecimento, através de seus sistemas humanos competentes essenciais, não são de fácil uso pelos consumidores e isto fica ainda mais difícil quando os consumidores são analfabetos tecnológicos, funcionais, estruturais, emocionais, culturais.

Nas regiões paradoxais os usuários de equipamentos nunca leem os manuais de operação, sejam eles de artefatos móveis, equipamentos ou automóveis para poder usá-los com segurança. Certamente esta é mais uma questão educacional e comportamental que econômica ou financeira para o consumidor, enquanto que para o produtor não parece haver questão alguma uma vez que ele consegue comercializar seus produtos muito bem.

Um bom exemplo aqui é o sistema de obtenção de carteira de habilitação e, mais ainda, os próprios curso (chamados de Escolas de Habilitação) cujo pessoal, ditos técnicos de ensino (ou coisa que o valha), às vezes não têm nem um curso técnico de nível médio completo. Esse pessoal está ensinando o brasileiro a dirigir carros (e os sistemas oficiais de habilitação como estão estruturados e como funcionam em sentido educacional e científico?); ensinando a lidar com tecnologias que eles mal conhecem tanto em sentido prático quanto em sentido teórico.

Rever ou reconstruir os modelos organizacionais passa por uma transformação da Governança Política a fim de poder acompanhar o desempenho da Governança Corporativa. A tecnologia supera a política e esta fica à mercê das transformações daquela sem querer promover sua autotransformação. A política anda a passos de jabuti enquanto a tecnologia anda a passos de lebre. Vale a pena ler a fábula-metáfora a Lebre e a Tartaruga [http://www.mujeresdeempresa.com/management/management060601.shtml. Consulte-me para receber uma tradução.]

Por falta de competentes essenciais políticos os donos do poder utilizam-se de artimanhas ocultas que institui, no país, os esquemas de corrupção que se alastram por todas as áreas acima citadas. A corrupção não é um caso de polícia, mas de educação. O mesmo se pode dizer da violência. Investir em caríssimos equipamentos de alta tecnologia para detectar e corrigir corrupção e violência é demonstração de falta de Habilidades Essenciais e uma grande miopia de Filosofia Administrativa (e de Administração Emocional) e de Filosofia Emocional. Ações como estas mostram que as instituições políticas estão obsoletas e os modelos atuais não mais têm competências para administrar os recursos e promover o desenvolvimento do país. Se os gestores públicos aplicassem os recursos para a educação integral de jovens e adultos em lugar de aparelhar os órgãos do aparelho político repressor certamente o ganho para a população e para o país seriam muito maior.

Pela minha visão, esta é uma questão devida à Obsolescência da Governança Política dos estados que se submete à Governança Corporativa de um grupo pequeno de empresas que avançaram no tempo tecnológico. Essas empresas para vender seus artefatos, procuram “criar uma necessidade” de uso através de um processo mercadológico intensivo em sublimação; um processo condicionador das pessoas, qualquer que seja a sua formação intelectual ou sua capacidade e domínio de conhecimento, a se envolverem emocionalmente e adquirir esses artefatos. Nessas ocorrências acidentais o que me chama a atenção é o número significativo de pessoas jovens que são envolvidas em tragédias fatais.

Como Saramago, eu também comecei com uma profissão: marceneiro. Hoje creio que não serei mais capaz de construir um móvel considerando o aparato tecnológico que existe à disposição dos profissionais: desde serras e tupias movidas por computador até tornos programados e robôs que realizam pinturas, colagens e acabamentos nas peças, sem considerar que até nas matérias-primas ocorreram transformações. Precisaria de novas emoções para realizar novas tarefas mesmo que o objeto continue sendo o mesmo de antes: a cadeira para sentar, a mesa para fazer refeições ou escrever, a cama para o descanso ou repouso e assim por diante.

O desenvolvimento traz consigo mudanças ou é fruto de mudanças e o desenvolvimento econômico mostra isto quando usamos hoje, em geral, os mesmos artefatos de ontem, mas que já são produzidos com instrumentos de produção, conhecimentos científicos e tecnológicos de amanhã. Instrumentos sofisticados que, muitas vezes, nem sequer percebemos como os artefatos e os objetos mudaram, ou como mais mudanças ocorrem em nossa volta.

Como o tempo tecnológico é mais rápido que o tempo de aprendizagem (poderia até ser dito, do que o Tempo Pedagógico e o Tempo Andragógico), torna-se, portanto, necessário uma nova matriz educacional para o país capaz de superar e eliminar a atual que foi imposta às pessoas antes da arrancada tecnológica da Terceira Modernidade ou Era Infoeconômica.

No Brasil, prima-se mais por “reformar” em lugar de “transformar” o mundo (a sociedade, a política, a economia, a educação, as pessoas). A primeira ação, normalmente, vem sempre acompanhada de uma maquilagem do produto ou da idéia, da norma e da lei, das diretrizes e da política com o que ficam mantidas as velhas emoções. É a fórmula de conservar a tradição sem modificar seu conteúdo; enquanto a segunda ação realiza uma destruição criativa destes instrumentos de regulação social e econômica e coloca em ação novas idéias para lidar com novos produtos ou novas emoções. Sem novas emoções será difícil desenvolver a curiosidade, a improvisação criativa e a criatividade entre os jovens.

Observem que, quando não se deseja mudar nada, duas expressões são bastante utilizadas nas organizações públicas e privadas do país, pelos políticos e empresários conservadores ou medrosos: comissão e reforma. Portanto, sempre que se está em um novo paradigma tecnológico são requeridas novas ações, novas emoções e, em especial, nova educação e realizar reformas apenas nunca irão resolver as questões cruciais que demandam novas energias.

Infelizmente, o velho permanece forte mesmo que novas caras e novas imagens sejam mostradas ao público. As falhas, os erros e os prejuízos são problemas das novas tecnologias que foram mal elaboras para o uso popular, eis a grande desculpa. O novo, neste caso, só é válido se for adaptado ao velho, ou se reduz a não criar nada que vá mexer com as velhas emoções, no velho paradigma, nas experiências e práticas passadas.


terça-feira, 8 de agosto de 2017

Leitura, Aprendizagem, Informação e Conhecimento para uma Administração IntegralÝ

O Ensino sozinho dificilmente orienta a pessoa para uma real (e significativa) educação, que resulte em alguma forma de Aprendizagem, sobretudo no modelo pedagógico que predomina no processo educacional brasileiro


Ilude-se o mestre que se julga um Ensinador de ideias (de suas ideias, geralmente) para alguém que ainda não sabe e ignora (não conhece) as coisas (valores) do mundo, em especial do mundo dos negócios, como ocorre em diversos cursos de administração, tanto de graduação quanto de pós-graduação. No máximo, o que consegue é tornar o “suposto aprendiz” um exímio repetidor de ideias (as ideias do Ensinador), ou de pensamentos e respostas criadas por outros (autores diversos dentro de uma área de conhecimento).

Infelizmente a Didática de Comenius não nos ajudou em nada para a educação e o desenvolvimento das pessoas e estamos atrasados 300 ou 400 anos em termos de educação e desenvolvimento humano. Este atraso vem se acumulando de forma perniciosa e as famílias que se formaram com base neste modelo ficaram acéfalas (ou com microcefalia intelectual) em termos de educação doméstica. Isto de alguma forma tem hoje como repercussão, em maior ou menor grau, o elevado índice de violência que está destruindo com a juventude do país, além de influir na escassez de profissionais creativos[1] e inovadores. Com isso, o campo fica aberto para a circulação e tráfico de drogas e armas que são usadas para intoxicar a massa e arma-la contra o sistema falido; e (os pedagogos ideologizados) por não terem onde se apoiar – seja em sentido técnico, seja científico e filosófico – apela para a vulgaridade, propagando que o que está ocorrendo na sociedade é próprio dos anarquistas. Não é verdade; isto porque todo o assentamento político atual no país desconhece a ciência política e, menos ainda, a filosofia Anarquista. São poucos os que leram algum texto sobre anarquismo e isto ocorre com muitas filosóficas políticas.

O lado triste (ou fraco e pobre, para não dizer medíocre) deste fato é a formação de uma massa de seguidores cegos ou no máximo míopes, que facilmente são manobrados e tratados nas organizações como meros recursos [...], quando lá conseguem chegar.

O ensino, em sua forma isolada, tende a gerar comportamentos (competências, visão, foco, etc.) reativos nas pessoas. Com isso as pessoas se sentem produtivas (sem nada produzir, efetivamente, por conhecimento próprio), sem, ao menos, perceber que sua cegueira ou ignorância se deve à repetição de soluções que lhes foram impostas e não aprendidas por intuição e creatividade próprias. Estamos instruindo as crianças, jovens e adultos para dominarem apenas o pensamento linear e excluir o pensamento sistêmico. Vale citar que:

A base de toda pedagogia anarquista é, obviamente,  a liberdade. Toda coação e toda imposição não só constituem em si mesmas violações aos direitos do aluno, senão que também deformam sua alma para o futuro e contribuem para criar máquinas ou escravos em lugar de homens livres. (CAPPELLETTI, Cap. 11, E-Book, 2013)

A Administração Integral está mais interessada no des-conhecimento, não apenas no conhecimento que as pessoas dominam, porque conhecimento é passado, algo já concluído e terminado; é erudição, ao qual não se pode mais acrescentar nada, enquanto que des-conhecimento é presente e pode contribuir para a formação de futuros que ainda não aconteceram.

O processo de ensino em vigor no Brasil tende a violentar a intimidade da pessoa, como colocou Philipe Perrenoux em uma entrevista dada no programa de televisão Roda Viva, TV Cultura (em 2003), além de lhe tirar a liberdade de aprender a pensar e a de crear seus próprios pensamentos, suas próprias respostas. Aqui reside uma das diferenças entre Ensino e Treinamento, próprios da Pedagogia, e Aprendizagem e  Desenvolvimento de Pessoas, próprios da Educação. Ainda existem pessoas e profissionais que confundem estes termos (educação e pedagogia) colocando-os em um único sentido ou conceito.

No Ensino (ou através dele) a pessoa adquire ideias e soluções já criadas e as repete por toda a vida (especialização, rotina). Na Aprendizagem (ou através dela) a pessoa constrói pensamentos e valores, elabora e soluciona problemas a partir da percepção interrogativa dos fenômenos e sua respectiva interpretação e desenvolve suas próprias soluções para os problemas identificados. Creatividade e Inovação são próprias da Aprendizagem; Operação, Aplicação Prática e Criatividade são próprias do Ensino.

No primeiro caso (ensino) o indivíduo fica dependendo do raciocínio lógico, geralmente repetindo o que já foi interpretado por outros, no segundo caso (aprendizagem) a ênfase começa no pensar não-lógico e soma-se ao lógico após interpretação do próprio ator (ou pensador-aprendiz). Segundo De Bono, “A lógica é mais um ‘mecanismo de comunicação’ do que um mecanismo de pensamento”. E mais: quando se trata de promover o amadurecimento emocional a percepção se torna mais importante que a lógica e De Bono salienta: “A lógica não muda as emoções; mas quando a percepção muda, as emoções também mudam”. (Op. Cit. 2000, p.39 e 50). Aqui se encontra a base fundamental de nosso ciclo APOR (Atenção, Percepção, Observação, Reflexão).

Outra distinção diz-nos que o ensino ajuda a fixar soluções (consequências) para problemas já identificados (Pensamento Reativo, conforme alguns autores, e Comportamento Reativo, segundo o modelo que aqui estou reelaborando), enquanto que a aprendizagem ajuda a identificar, a partir da atenção, percepção, observação e reflexão (Ciclo APOR) dos fenômenos (deterministas ou não-deterministas), os diversos problemas (questões, fatos, fenômenos, pesquisas) existentes no ambiente organizacional, selecionar as variáveis dependentes e independentes; escolher o método (convergente ou divergente); formular as hipóteses ou soluções; filtrar as alternativas e escolher as ferramentas de ação adequadas; aplicar as ações para alcançar os resultados desejados (visão), tornando-as (proatividade) em atividade (reatividade positiva) construtiva e controlada para serem postas em prática (novos padrões) com o propósito de colocá-las em beneficio do conjunto (equipe, comunidade, organização, etc.).

Outro ponto importante a salientar é o que considera o ensino como função (impositiva, reativa, dominadora) do mestre (Ensinador); enquanto que a aprendizagem é considerada como processo (creativo, transformativo, proativo, colaborativo, cooperativo, amorativo, humorativo, humanizativo, etc.) do aprendiz subsidiado, sempre que necessário, pelo facilitador, coach ou mentor (Aprendedor); cabendo ao aprendiz depositar a confiança ao declarar-se conhecedor de sua ignorância (insipiência) e seu interesse em ser ajudado, em ser formado a partir de uma aprendizagem efetiva, sendo respeitado e não violentado em sua intimidade. Aqui podemos inserir uma assertiva que salienta que o Ensino bloqueia a mente da criança e, consequentemente, do jovem e do adulto, enquanto que a Aprendizagem promove o desbloqueio e a abertura da mente para proporcionar a creatividade.

Para uma leitura que trata também destes elementos sugiro o livro A Avaliação Profissional e o Processo Educacional Brasileiro (2004). Neste livro discuto de forma abrangente as questões relacionadas com a educação, considerando o ciclo EPEA (Extensão, Pesquisa, Ensino e Aprendizagem) como sendo o cerne de um sistema educacional proativo e a base para uma Educação Integral, ao qual agora estou agregando o Processo Dinâmico LAIC (Leitura, Aprendizagem, Informação, Conhecimento).

Para atender à primeira função (do mestre) o aluno (a pessoa insipiente) é forçada a aceitar as soluções desejadas (regras) que são apresentadas pelo Ensinador, sem direito a contestar (cassação da liberdade) a sua validade no ato da ocorrência do fato, para não ser penalizado (reprovado no exame de uma disciplina). O Ensinador impõe soluções uma vez que lhe coube (somente a ele) identificar o problema (as suas variáveis e as possíveis soluções). O Ensinador é um Erudito, portanto tenta transmitir o que ele acumulou: o passado. O Ensino realiza o Que e o Como cabendo ao aluno apenas a obrigação de fixar (decorar) aquilo que o Ensinador explicou.

Para atender à segunda função (do processo) o aluno (a pessoa insipiente) deve estar disposta a investigar e reconhecer sua ignorância (igual a falta de saber e vontade de aprender) e sua vontade de conhecer. Como ele ainda não sabe as soluções do problema que acabou de identificar (?) nos fenômenos considerados, percebidos (evidência) ou observados, ele necessita (e é obrigado a) crear essas soluções e, para isto, não deve ter medo de errar. Neste caso, o “erro é uma benção”, como diz um aforismo japonês, porque somente a partir dele podem-se identificar as possíveis soluções (hipóteses), experimentá-las e escolher a melhor, que agregue maior volume de valor, e a pessoa, neste processo, se torna um A-prendiz (Ser Livre) para voar sozinho. Veja a narrativa a seguir.

  Existem algumas histórias de ficção que ajudam a compreender esta metáfora do Ser Livre e uma delas é a de Fernão Capelo Gaivota (BACH, s. d.). Nesta história a recusa de Fernão em ser mais uma mera gaivota como seus companheiros é um exemplo de luta contra o seu Ensinador que queria treiná-lo (adestrá-lo) apenas para conseguir garantir sua alimentação. Para a maioria, o importante não é voar, mas comer. Para esta gaivota [Fernão], contudo, o importante não era comer, mas voar (salienta BACH, s.d., p.15). Fernão desejava ter um Aprendedor que lhe permitisse escolher entre comer e voar; comer, ainda que, com algumas raras orientações possíveis, qual a sua solução para o voar, o pescar, o reunir-se em bandos, e não lhe impor essas (as dele, do Ensinador) soluções. O Caminho de Fernão assemelha-se ao itinerário (caminho) do herói segundo Campbell (citado por KOFMAN, 2001, p.168). Fernão reconhece sua ignorância, sua insipiência, seu des-conhecimento – primeiro passo para a busca da sabedoria –, e isto o ajuda a definir uma visão para a sua vida. Ser sábio é saber-se des-conhecedor e isto Fernão logo aprendeu. Ao afirmar onde deseja chegar, Fernão também se preocupa com o prazo, com as metas e define um foco. Ele identifica um problema em sua existência: Por que ele deveria ser igual às demais gaivotas? E como ele deveria SER? E, mais: O que ele deveria fazer para alcançar aquilo, aquele desejo, aquele sonho que ele desejava SER, o de aprender a voar? Ele viu longe. A visão longa (de longo alcance, de longo prazo) é uma arte própria dos visionários, dos líderes proativos, mas só é importante se conseguir alcançar metas e focos ousados (em curto prazo). Isto é próprio das pessoas a-prendizes e, raramente, é encontrado nas pessoas a-lunas ou dependentes de en-sino. E ao negar-se diante do que se prometera após ouvir o chefe do bando, Fernão torna-se livre. As promessas de momentos antes estavam esquecidas, varridas por aquele enorme vento rápido. E, contudo, não sentia remorso por não cumprir as promessas que fizera a si próprio. ‘Essas promessas são só para as gaivotas que aceitam o vulgar. Quem conseguiu chegar à excelência da sua aprendizagem não tem necessidade desse tipo de promessa’. São as palavras contundentes de Fernão, as quais se assemelham ao sentido que se dá sobre organizações de aprendizagem.

Como afirma Kofman (2001), a aprendizagem não é algo que ‘outro lhe dá’ senão um desenvolvimento de competências pessoais que realiza por si mesmo (possivelmente com a ajuda de outro). Ao proceder assim, a pessoa começa a sua viagem a partir do nível de ignorância (insipiência) para o nível de iniciante (incipiência), em seguida para o nível de incompetência e deste para o de competência; e assim, durante toda a vida, estamos sempre circulando, de um nível a outro, porque sempre existe algo novo, desconhecido, que necessita ser aprendido por nós. Este é o Caminho do Aprendiz. Deixar de ser uma mera gaivota ou de ser mais uma ovelha (ver história do tigre que se criou no meio de um rebanho de ovelhas, cf. KOFMAN, 2001); é o desafio de todo aprendiz para assumir a responsabilidade de aumentar sua competência (KOFMAN, 2001, p.187).

Considero aqui que a aprendizagem tende a conduzir o a-prendiz mais efetivamente a acumular certo volume de aptidões que vão resultar de forma importante para a construção das habilidades essenciais e, por consequência, na construção da maturidade do indivíduo. Yus (2002) procura mostrar esta discussão quanto à educação em relação à individualidade do indivíduo. Neste sentido, este Autor considera válido que

O estilo de aprendizagem depende de dois fatores: as habilidades perceptivas (significados com que captamos a informação: abstrato ou concreto) e as habilidades de pensamento (formas em que organizamos, sistematizamos e dispomos da informação: sequencial ou aleatória). A combinação dessas habilidades se dá a partir de quatro tipos básicos de estilo: organizado (concreto-sequencial), inventivo (concreto-aleatório), analítico (abstrato-sequencial) e sensitivo (abstrato-aleatório), faz com que cada um deles seja mais receptivo para determinados tipos de atividade. (YUS, 2002, p.57)

Enquanto o alumni (a-luno, equivalente a “sem luz”, não iluminado) se mantém como um receptor passivo do ensinamento, portanto submisso às ideias e às mensagens do Ensinador; o a-prendiz vai mais longe, ele é mais corajoso e ousado, portanto proativo e aceita, ou não, as ideias do seu Aprendedor, e faz delas sua base de aprendizagem, ou não.

Ao contrário do aluno, o aprendiz não tem medo de errar porque sabe que no erro se encontra alguma oportunidade significativa para aprender a ser competente. Errar tendo como base o Pensar é diferente do errar com base no decorar (Fazer). Ele age como um ator proativo diante de cenários graças a sua visão prospectiva, ou seja, posicionada no longo prazo, no futuro (ainda que este seja incerto ou não previsível), sem perder o contato com o mundo hoje (presente). O autêntico aprendiz se permite cometer erros sem recriminar-se, pois sabe que a única maneira de aprender é tratar de fazer coisas que excedem sua área de competência (KOFMAN, 2001, p.187).

Vale salientar a guisa de conclusão deste tópico, a relação que existe entre ensinar ou colocar na cabeça de outrem pensamentos e ideias que não foram criadas por ele, e entre aprender e pensar ou criar seus próprios pensamentos. Na primeira situação o indivíduo não é dono de suas ideias, ou melhor, ele não constrói ideias próprias. Em resumo, ele não é um pensador e também não poderá ser creativo. No máximo poderá ser criativo na realização das operações, das suas atividades. Como expressa Basin (2003, p.129)

Pensar é a única avenida para tornar-se criador consciente. Só o pensamento original tem energia potencial suficiente. O pensamento de outrem que você memoriza não tem potencial criativo, a não ser para quem o pensou inicialmente. Para ser criativo, a estrutura interna do pensamento precisa ter potencial para tornar-se uma forma-pensamento.

Neste raciocínio repousa uma afirmação que formata minha teoria pedagógica/andragógica voltada para a liberdade através do pensar ou para o a-prender e isto é o que menos se faz nas escolas e nos cursos desde o jardim de infância até o curso superior.

O indivíduo não aprende nada nas nossas escolas senão apenas a memorizar alguns pensamentos de outros indivíduos. Não aprender a pensar, a perceber e a observar é um caminho que leva a pessoa a se tornar algo inútil ou mesmo insignificante para o mundo porque não foi dotada de energia suficiente para auto-organizar-se e ampliar sua consciência do mundo; como é própria da segunda situação da assertiva anterior. Ainda dentro do raciocínio de Basin (2003, p.129) encontrei uma proposição que coincide com as minhas ideias sobre o que se tem denominado de pedagogia, como seja:

Infelizmente, as escolas não ensinam nem incentivam os alunos a pensar. O sistema educacional está todo baseado em estudar e memorizar o que foi dito ou feito anteriormente. O pensamento original não é bem-vindo. Como você pode conhecer a arte de pensar, se ninguém lhe ensinou? A maioria da população precisa compreender que a única maneira de sair de uma situação indesejável é fazer algo que esteve evitando toda a sua vida. As pessoas têm de “fazer seu próprio pensamento”. Precisam estudar e praticar a arte de pensar. (BASIN, 2003, p.129).

No momento em que a pessoa começa a aprender a pensar tende a sair de sua caverna mental, na qual esteve o tempo todo aprisionada pelos pensamentos de outras pessoas, e inicia seu processo de voar sozinha; isto tende a conduzi-la na direção do conhecimento proativo, e somente através deste é que o homem começa a nascer verdadeiramente. De acordo com Buzzi (1988, p.15),

Foi Parmênides de Eléia (540-450 a. C.), pensador da Grécia antiga, quem por primeiro mostrou, num discurso incomparável, que nosso pensamento está na necessidade de ir além de si... em direção ao real, à procura do ser. Por causa disso precisa aprender a pensar. Quanto mais aprende a pensar, mais se torna conhecimento que deixa transparecer que ao pensar se torna semelhante ao ser. (Grifo acrescentado). (BUZZI, 1988, p.15)

Portanto, para seguirmos no sentido de uma Administração Integral, na qual o homem esteja sempre posicionado como a parte pensante do processo, é preciso que ele aprenda a pensar; e para isto torna-se necessário que o ensinamento seja substituído pela aprendizagem, o treinamento pelo desenvolvimento, desde a escola até à organização, e que as próprias escolas e faculdades se tornem organizações de aprendizagem. Precisam seguir um processo LAIC que envolve tanto o sistema diretivo da organização educacional, quanto os facilitadores e mentores que vão aplicar os elementos para estimular o processo de aprendizagem.

Para que isto se realize a empresa deve começar a tratar seu pessoal não mais como recurso, uma vez que recurso não pensa, apenas faz quando muito. Precisa considerar que as pessoas são sistemas complexos e, como tais, precisam ser livres.
Referências
BASIN, Gennady. A arte de Se Tornar. São Paulo: Madras, 2003.
BACH. Richard. Fernão Capelo Gaivota. Rio de Janeiro: Record, 2003.
BUZZI, A. R. Introdução ao Pensar. O Ser, o Conhecimento e a Linguagem. Petrópolis: Vozes, 1989.
CAPELLETTI, Angel J. La Ideología Anarquista. Buenos Ayres: Libros Tauros, E-Book, Baixado de www.librostauro.com.ar em 24/12/2013.
DE BONO, Edward. Novas Estratégias de Pensamento. São Paulo: Nobel, 2000
KAUFMAN, Freddy. Metamanagement. Buenos Ayres: Granica, 2001, Vol. I.
SILVA, J. M. A Avaliação Profissional e o Processo Educacional Brasileiro. Vitória da Conquista: UESB, 2004.
YUS, Rafael. Educação Integral. Porto Alegre: ARTMED, 2002.




Ý Capítulo 4 do livro “Administração Integral e Organização Holística” em fase de revisão para publicação.
[1] Uso em algumas frases a palavra creativo em lugar de criativo quando estou me referindo ao Ato de Pensar e uso a segunda forma para o Ato de Fazer. Procuro com isto diferenciar a creatividade da criatividade usando o sentido original da palavra no verbo criar que vem do latim creare. Considero crear como a forma plena de usar as habilidades cognitivas, ou seja, o Pensar em sua forma holística e criar para a forma plena de usar as aptidões  ou a capacidade para Fazer. Curiosamente, nosso idioma é o único neolatino que usa o verbo na forma criar. V. Hubert Rohden, Educação do Homem Integral. São Paulo: Alvorada, 1984.